sábado, 18 de julho de 2015

Fico por aqui…



“Os que amam os outros serão sempre amados…” 

Consegui chegar ao cemitério depois de tudo! Fraquejaram-me as forças logo pela manhã pois não sabia, como lidar, com o medo da despedida que invadia a minha mente. Quando o meu irmão, amigo e mano (na verdade meu sobrinho) Alfa Baldé ligou-me para dizer que estava ligeiramente atrasado, os meus pés estremeceram.

 Depois de não surtir efeito a desinformação encomendada lançado logo na manhã de sexta-feira, levando que contradissesse mais uma vez uma informação postada neste mural. Só os deuses sabem o quanto quis evitar este momento de vazio, mas aqui estou, com pouca vontade de participar neste jogo de informação e desinformação da nossa praça. Para evitar  um ou outro tropeço no erro crasso, fico por aqui!

Ontem cheguei em Bissau por volta das 22 horas, depois de uma jornada em Safim, onde fui assistir o primeiro centenário da morte do N’kanandé Ká. Passando pelo Bairro d’Ajuda, lembrei ter falado ao Alfa – Então, sabes alguma coisa sobre à transladação da Rosete, logo cedo estive na agência de viagens X e fui informado que só viria na próxima semana…terça-feira creio, dia 21 de julho…

Alfa – Quem foi que disse isso? Devem estar a tentar complicar-te o juízo…O corpo veio hoje a tarde como estava previsto, e amanha às 10 horas será o funeral…

Um silêncio devastador preencheu no segundo seguinte o momento…

O resto do percurso para  o hotel com o meu mano Alfa, continuou marcado pelo silêncio, fomos escutando a música até que num certo momento, já quase a chegar ao meu destino, disse-me: “amanha venho buscar-te para irmos juntos ao funeral…”

Tinha que ir sim, estava na hora e, o dia para um último adeus a amiga, irmã e mana Rosete, tinha chegado. Descansa em Paz grande MULHER! 

Foi muito emocionante, mas estive lá, e consegui falar mantenha no choro, transmitindo os sentimentos de pesar e os pêsames da minha família!!!

Como também é para mim emocionante, despedir-me, de tod@s @s leitor@s deste mural de nome ORDIDJA!

Sim, chegou ao fim!!! 

Foram alguns aninhos de algumas peripécias, efeitos colaterais e momentos estonteantes. Termino com o primeiro Post que fiz naquilo que seria o primeiro ensaio.
Este mural chega ao fim, em nome da forma e o papel de informar que vive da verdade, fortemente rigoroso, isento em todos os sentidos e extremamente sério com as notícias.

Decreto, por livre e espontânea vontade que, à partir desta data, as minhas opiniões transformadas em escritos e post neste espaço virtual, TERMINARAM!

As minhas humildes intervenções, no pleno gozo da cidadania ativa, serão, manifestadas provavelmente em outros espaços. À Ordidja, chegou ao mau porto, irá atracar no silêncio e conformismo que o momento obriga e, praticado pela maioria!!!

Sem lamentos, nem sentimentos me despeço com a consciência tranquilíssima deste politiquismo do teclado, que sem ganhar um tusto, conta com cerca de uma década existência. Penso que dei com simplicidade e, na melhor das intenções o meu quinhão. 
Na senda de dar sempre o rosto e corpo ao manifesto em tudo o que faço, o espaço virtual, não poderia ser diferente. Logo na net, onde como se sabe, é muito fácil esconder. Fingir anónimo para cobardemente escrever e dar uma opinião sobre algo ou uma pessoa, nunca foi minha praia. O caráter que carrego e, a frontalidade que me é reconhecido, inibiram-me para tal comportamento de viver na sombra! 

Como escrevi uma vez, desde criança, nunca fui de atirar a pedra e esconder o braço. Por maior mal que tivesse sido o estrago causado na pessoa (fura cabeça), na janela (partir o vidro) ou mesmo telhado (de zinco).  
    
Com pontapé de saída dado no primeiro BLOG que criei “Afrolhar” tive uma passagem obrigatória naquilo que considdero, espaço pioneiro, CONTRIBUTO, do mais-velho Fernando Casimiro (Didinho) a quem aproveito para agradecer a oportunidade.

Decidi aventurar  pela Ordidja, quando quis criar um novo BLOG. Reconhecendo sempre que um blog é uma ferramenta de comunicação e na maior parte das vezes uma página pessoalíssima (e aqui coloco o plurativo sem reservas) de comunicação. Segundo as minhas contas, estava a caminho de cerca de 5 anos.

Gostei da viagem! Com algum cansaço e vontade de entrar na concha da descrição a voz do silêncio falou mais alto! Definitivamente, fico por aqui!!! Terminando como comecei no "o primeiro..."

Bem haja à tod@s!!!

Paz e Bem… 
O primeiro...
Com a Guerra na Guiné…
Veio o Medo e a cultura da morte...
Mortes, sangue, fuzilamentos
Matanças, Matanças e Matanças
Vinganças, ódio, torturas
Crianças mortas
Mulheres mortas
Homens em número incontável
Mutilados aos milhares
Órfãos aos pontapés
Traumatizados em milhões
Traições, perseguições e calúnias
Mistérios sobre Mistérios...

sexta-feira, 17 de julho de 2015

O Verdadeiro Perigo: Mensagem ao Presidente Dos Santos



Senhor presidente,

A improbabilidade de nos encontrarmos leva-me a tentar conversar consigo por esta via. Espero que me responda. O tempo é de diálogo. Apesar de ser um crítico acérrimo do seu modo de governação e do consequente sofrimento da maioria do povo angolano, admiro-o pela forma estóica como mantém o poder e compreendo muito bem a sua angústia perante a possibilidade de o perder.

Escrevia o Padre António Vieira: “Pulvis es, tu in pulverem reverteris”: Sois pó, e em pó vos haveis de converter. Sois pó, é o presente; em pó vos haveis de converter, é o futuro. É esse futuro que tentais evitar a todo o custo e do qual resulta a angústia que menciono.

Durante algum tempo da minha infância, nutria por si um sentimento de terror. Sabia, nessa altura, quando o senhor presidente agendava uma saída da sua residência oficial na estância balnear do Futungo de Belas. 

Nessas ocasiões, por volta da meia-noite ou um pouco mais tarde, sentia a casa a tremer e a mãe, alarmada, vinha retirar-me do quarto para o quintal. A guarda presidencial transportava para a rua onde até hoje vive a mãe, em camião apropriado, um tanque de guerra soviético. Essa monstruosidade manobrava então para posicionar-se na estreita e curta travessa para a qual dava a parede dos dois quartos da casa. A estrutura era tão pobre e os tijolos já corroídos pelo salitre, por ser junto da praia, na Samba, que uns centímetros de desvio na manobra do tanque seriam o adeus eterno da minha família. A saída do presidente do palácio forçava-nos, então, a dormir no quintal até à retirada do tanque.

A minha infância ficou marcada por esse paquiderme de aço que, com um breve gesto, poderia desfazer a nossa casa e família, mesmo sem querer. Não gostava de si por causa desse perigo de vida que corria sempre que o senhor presidente saísse do seu palácio. Rezava para que não tivesse de sair de lá. Eu frequentava a igreja, senhor.

Em 1992, tive o privilégio de, pela primeira vez, ir a uma festa sua de aniversário, no Futungo de Belas. A minha expectativa era grande. Ia observar o convívio entre os dirigentes do meu país. Quando o senhor se retirou da festa, vi um ministro dar instruções para que um arranjo de lagostas fosse levado para o carro dele, um general a desviar uma preciosa garrafa de whisky, governantes e comensais a saquearem o que havia no banquete. Na altura, julguei tratar-se de um acto de generosidade da sua parte. Mas saí do Futungo de Belas muito mal impressionado com o tipo de indivíduos que o auxiliavam e continuam a auxiliar na governação. Se nem sequer se coibiam de levar a comida e os beberetes do palácio, como poderiam conter-se e gerir com probidade o património público?

Desde então, não mais tive ilusões sobre si ou os seus colaboradores.
Conto apenas estes dois episódios não para recriminá-lo, mas como um desabafo de alguém que, como milhões de cidadãos angolanos, tem mais experiências negativas do que positivas com o seu exercício do poder.

Muitas vezes interrogo-me, com perplexidade, quando noto que o senhor presidente se sente ofendido ou ameaçado com actos normais de descontentamento de cidadãos: Quão ofendido ou descontente teria eu de me sentir para fazer justiça ao que já sofri às mãos do seu regime?

Imagino o que passará pela cabeça de milhões de cidadãos, também afectados. Só a livre expressão nos poderá libertar de perigo de os recalcamentos se tornarem sentimentos de ódio, frustração e vingança.

O respeito que o senhor merece é o reflexo da forma como respeita os seus governados e os seus interesses comuns. Já prescreve a Terceira Lei de Newton, que o senhor presidente como engenheiro conhece: “Para toda acção há sempre uma reacção oposta e de igual intensidade”.

Em 1999, quando o senhor presidente ordenou a minha detenção, por se ter sentido ofendido com os meus escritos, passei a compreendê-lo melhor: é um homem poderoso, mas inseguro. Apreciei o gesto do seu secretário que me visitou para saber do meu estado de saúde e de espírito na cadeia. Apesar dos horrores por que aí passei, guardei uma melhor recordação da minha experiência por causa dessa visita. O então director da Penitenciária de Viana, Francisco Ningosso, enviou-me um cartão de amizade à cela, para um encontro debaixo de uma árvore que lá havia, e tivemos longas conversas. Esse diálogo foi interessante. O meu privilégio, no entanto, foi ter documentado e reportado sobre as violações dos direitos humanos na cadeia.

Desta vez, senhor presidente, não envie o seu secretário para saber da saúde dos jovens. O procurador-geral da República, general João Maria de Sousa, precipitou-se ao anunciar publicamente, enquanto zelador da legalidade, que os jovens estariam a preparar um golpe de Estado contra si. Desacreditou o que resta de seriedade deste órgão judicial. O general João Maria de Sousa é muito mau. É péssimo a servi-lo. A descrença no sistema judicial não contribui para a a sua segurança.

Veja bem: o sistema judicial é o que o poderá proteger da barbárie se alguma vez a situação política mudar. O sistema judicial é a fina película que separa a civilização da selvajaria. Não comprometa o sistema judicial. Não comprometa a civilização e o direito.

O senhor presidente deveria ouvir o sussurro entre os operacionais dos próprios serviços de inteligência, que lhe são leais. Acham que o aproveitamento político-judicial dos relatórios de vigilância das actividades dos activistas detidos, para tão grave acusação, é contraproducente.

Gostaria, senhor presidente, que considerasse o meu pedido para ordenar a libertação incondicional dos seguintes cidadãos: Afonso Matias “Mbanza Hamza”, Albano Bingobingo, Arante Kivuvu, Benedito Jeremias, Domingos da Cruz,Fernando Tomás “Nicola Radical”, Hitler Jessia Chiconda “Samusuku”, Inocêncio Brito “Drux”, José Hata “Cheik Hata”, Luaty Beirão, Nelson Dibango, Nito Alves, Nuno Álvaro Dala, Osvaldo Caholo, Sedrick de Carvalho e o capitão Zenóbio Zumba.

Seria um acto de coragem política e de moralidade constitucional devolver os referidos cidadãos à liberdade. Como o mais alto magistrado da Nação, deve manter a reserva moral para corrigir actos institucionais danosos para o Estado de direito e, sobretudo, para a relação entre este e a sociedade em geral.

A soberania é a decisão da excepção, não é a conformidade burocrática.
A soberania é a afirmação de vontade de um povo através dos seus órgãos.

Senhor presidente, surpreenda a nação. Surpreenda-nos pela positiva e será reconhecido por isso. Pelo seu gesto de estadista e de defensor da constituição, que bem lhe serve, para além do meu modesto agradecimento, teria a honra de convidá-lo para um almoço vegetariano. Tem a minha garantia de que sou um bom cozinheiro e bom contador de estórias para entretê-lo ao almoço. Senhor presidente, proteja-se com a ética da Constituição e ouvindo os seus críticos, que são os que menos mal lhe desejam.

Nobas soltas...


Está previsto para hoje, a transladação da urna da Jornalista Rosete Reis, para Bissau. De recordar que a malograda faleceu na última sexta-feira em Lisboa. O jornalismo guineense perdeu uma das maiores referências da classe, pois a Rosete Reis foi uma profissional abnegada, rigorosa (até demais) e extremamente competente. Tive a sorte e o prazer de trabalhar com ela entre 2001/2003, durante o período em que ela desempenhou a função de correspondente da RR na Guiné, substituindo o jornalista Muniro Conté, e nos anos 2003/2006 já na Guiné, foi uma âncora para o formato da Rádio Sol Mansi. As emissoras de rádio de Bissau farão uma cobertura em direto a partir do Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira, num último adeus a uma profissional sem mácula.

Num dia de extrema tristeza e sofrimento, quero aproveitar mais uma vez a oportunidade de endereçar a toda a família especialmente o Dr. Amine Saad e a Amina (esposo e filha), aos colegas de profissão da Rosete, em especial ao Agnélo Regala e ao Muniro Conté, à todos, os meus sentidos pêsames e profundo pesar por esta perda irreparável nos vossos corações. Descansa em PAZ amiga, e irmã Rosete Reis!!!  
  

Termina hoje, o ciclo de conferências e workshops sobre a vida e obra do lendário N’kanandé Ká. Organizada pela ONG Bios, as jornadas de reflexão serviram segundo o Dr. Jorge Otinta para “ de uma forma singela e inédita lembrarmos e unirmos a volta do primeiro centenário da morte, de um mártir da resistência e da luta contra o domínio colonial…”. 

As jornadas começaram em Safim, depois seguiram para Prabis, na semana passada estiveram em Quinhamel e, hoje estarão em Biombo (Meca da etnia Pepel). O início das atividades, está marcada para às 9 horas, com uma partida de futebol de equipas locais, e depois seguir-se-ão palestras e debates neste dia 17 de julho, há cem anos atrás desaparecia fisicamente o régulo (rei) de Biombo N’kanandé Ká um “combatente desconhecido” que sem recuar um centímetro resistiu de forma exemplar aquilo que viria à ser décadas de domínio  bárbaro e sangrento dos portugueses colonialistas.
Completa-se hoje os 30 dias sagrados de jejum e entrega dos irmãos muçulmanos. Em muitos países árabes vai-se celebrar nesta sexta-feira o Ramadão. Tradicionalmente na Guiné, nunca se sabe qual é o dia para a celebração desta data religiosa que fica sempre dependente do nascimento da Lua Nova. 
 
Segundo muitos citadinos de Bissau, criou-se até um mito urbano à volta do dia de sexta-feira, em que, segundo o mito, não se pode celebrar o fim do jejum, pois caso contrário, é a queda de quem está no poder e manda na Terra. Nos outros países africanos da região (Burkina Faso por exemplo), este mito incide mais nos ímanes e líderes das mesquitas. 

No fundo, todos sabemos que esta data foi sempre o motivo da épica discórdia, entres as duas correntes (alas) existentes na religião muçulmana. Aproveito desde já para endereçar os votos de boa celebração para todos os irmãos guineenses fiéis aos princípios sagrados do Islão e que sacrificaram durante este período de redenção. 

Que as vossas preces e orações pela PAZ, TRANQUILIDADE E PROGRESSO seja um grande gardicementu para a nossa querida GUINÉ!