quarta-feira, 6 de junho de 2012

O dia seguinte

Sr. Helder Pedro Delgado (Dédé) foto da página no facebook

Nem sei como começar! Hoje no dia seguinte a dor parece maior...
Em resumo o que se passou ontem foi isto: o celular tocou eram cerca das 18h 15m de Brasília; como estava a conduzir (a caminho do Colégio para buscar os meus filhos) olhei para o écran do aparelho e dei conta do registro VP;  a chamada era do irmão, amigo e colega de infância Victor Barbosa Vicente (VP) que vive em Brasília a cerca de 15 anos e tem sido uma companhia agradável por aqui; quando atendi o dialogo foi este;

- VP, i kuma?
- Alin li nhe ermon, kuma ku bu sta?
- Djubi na conduzi, di li mas um bokadu na ligau...
- Ok, ma djubi n’tene um notícia muito tristi pa dau...
- Kau fala...
- Suma nô papia di el ontordias, n’fika mas tristi inda...
- Kila i kin?
- Tio Dédé, madju...I falci...Gós ku Charles kontan...
- Kau falan kila!!!

Silêncio com magoa, dor, angustia, tormento, tristeza em catadupla, tudo misturado num só momento.

O Tio Dédé ou Sr. Dédé, era como na maior parte das vezes como as pessoas tratavam o Sr. Helder Pedro Delgado. Irei guardar para sempre dele, o Homem com brilhante espírito jovem, amável e de simples trato. Pena que não seja imortal, para que jamais fossemos privados da sua presença exemplar e digna, razão de ser detentor de um círculo de amizade imensa.  Com uma conduta ímpar o Sr. Dédé era fruto daquela Educação antiga de Bolama!

Para os que não o conheceram, o que poderei escrever desta figura impar neste momento de dor e consternação numa altura em que as lagrimas não poupam os meus olhos?

Bolamense, adotivo no mítico Bairro Tchon di Pepel, Helder Delgado (Dédé) foi um dos poucos quadros administrativos antes da Independência Guiné-Bissau nas Finanças. Autêntico (homem de praça) foi preso devido a sua bravura de confrontar o regime autocrático de Luis Cabral. Sobre esse período lembrava com certa tristeza, de ter tido como um dos carcerários o Buscardini, que como contava “foi uma pessoa com que partilhou boa convivência em tempos de Bolama”.

Outra magoa foi, a forma cruel e injusto que lhe tiraram da casa onde viveu com os pais e irmãos quando chegaram à Bissau vindos de Bolama e onde vivia com a família, no Tchon di Pepel. A ganância de uns e traição de outros, riscaram-lhe esse destino. Mas como sempre e com o espírito alegre gozava muitas vezes dessa situação afirmando “fui apenas mais um, entre muitas vítimas dos calotes das compras e vendas das casas de Bissau”. Essa casa (situado na atual Rua Marien N’gaubi, antiga Rua Guerra Junqueiro) foi uma verdadeira Casa da Cultura. Quase todos os músicos e compositores de Bissau nos anos 80 passavam por lá. Sempre amável e acolhedor, Sr. Dédé recebia na sua casa, todas as pessoas, independentemente dos estratos sociais. O Justino Delgado foi acolhido nessa casa quando chegou de Bubaque, o Rui Sangara (Sanguis) fez as primeiras musicas no quintal dessa casa o irmão Atanásio (Atchuen) não tirava o pé da moransa, o Patchi (África Livre) brindava a todos com o seu gênio musical nessa casa, enfim...   

Bom orador e fundamentalmente conciliador, sobressaia mais esse dom no Sr. Dédé, quando as lindas noites de serenata que promovia em frente da casa onde morava (no passeio) tendiam para debates mais calorosos e exaltados. Bom conversador, não olhava a idade para ser amigo.

Congratulo-me de ter conhecido este Homem, no meu caso, o guardarei para sempre como uma pessoa rara, que veio ao mundo para, com exemplos dignificantes do seu modo de ser ensinando os menores e, ressalvo aqui que concordava em quase tudo com ele, mas havia um assunto que discordávamos um do outro, o futebol. Sportinguista ferrenho, o seu Sporting era sempre a melhor equipa, mesmo contra o Benfica. Sr. Dédé, como vê, essa nossa rivalidade é eterna!  

Desta vez, embora triste, faço este pequeno testemunho para informar aos leitores e não deixar passar “aquele tempo” isto para não repetir o que aconteceu a quando da morte de outra figura de proa bissau-guineense o irmão e amigo Tony Bana, que como Sr. Dédé, partiram deixando a todos os conhecidos, amigos e familiares um vazio sem fim.

Aproveito para deixar os meus sentidos pêsames a todos os familiares em especial a esposa Professora Nandinha, aos filhos Waldir (Puma), Danilson (meu irmão Dany), a Dilma ao Xito as netas Janice, e a Janine (minha afilhada) e toda a família Delgado.
Paz e eterno descanso, Sr. Dédé!