Mussa Baldé
Por: Mussa Baldé
Muito
se disse e muito ainda será escrito sobre a figura do Dr. Kumba Ialá que acabou
de deixar (fisicamente) o mundo dos vivos para entregar a alma ao Senhor, dono
do Céu e da Terra. Ainda fiquei na duvida se devia ou não escrever algo sobre o
Dr. Kumba Ialá. Pelo sim pelo não, decidi-me em rabiscar estas linhas para
partilhar convosco aquilo que é a imagem que guardo de Kumba Ialá. Confesso que
não fui aluno dele no liceu, pois quando vim para Bissau estudar já ele estava
nas lides políticas à sério no dealbar da criação do seu PRS.
Conheci Kumba
Ialá em 1993 era eu um dos assessores de imprensa na Comissão Eventual para a
Revisão Constitucional (Cercle), que funcionava paredes-meais com a sede da OMS
em Bissau onde se discutia as linhas mestras do multipartidarismo. Digamos é
nessa Cercle que se cozinhava a democracia. Kumba Ialá lá estava em
representação do seu novel partido, ele e Artur Sanhá que seria
secretário-geral do PRS. Nesta hora da sua surpreendente morte, creio que seria
de bom tom render homenagem à Kumba Ialá pelo papel que teve na abertura
democrática.
Personalidades como Nino Vieira, Helder Vaz, Kumba Ialá, Domingos
Gomes Fernandes, François Mendy Kankoila, Aristides Menezes, Agnelo Regala, Amine
Saad, João da Costa e tantos outros, devem ser elevados ao estatuto de
pais-fundadores da nossa democracia. Sim. Porque foram eles que lutaram,
desbravando florestas de espinhos, contra a vontade de muita gente da nossa
praça política para que hoje tenhamos a alternância política, a liberdade de
manifestação e de reunião. Kumba Ialá deu o seu quinhão.
Lembro-me dos famosos
comícios de Kumba Ialá no Alto-Crim onde fazia as pessoas aguardar pelos
“mbuludjus” que dizia ter para desvendar. Lembro-me da forma entusiasta como as
pessoas voltavam para casa após os comícios de Kumba Ialá mesmo sabendo que das
prometidas revelações bombásticas não traziam nada. Aquilo fazia furor apenas e
só pelo facto de permitir que muitos ousassem participar num comício que não seja
do velho PAIGC. Era uma espécie de escape ao centralismo democrático que muitos
agora apelidam de ditadura, coisa que na minha óptica (ou será antes ótica?)
não colhe pois creio que não experimentamos a ditadura na verdadeira essência
na Guiné-Bissau.
Tornei-me a cruzar com o Dr. Kumba Ialá já era ele Presidente da República.
Enquanto jornalista ia cobrir os assuntos da presidência. O Presidente deixava
sinais evidentes de ter uma certa simpatia para com os jornalistas, mas da
minha parte nunca recebi qualquer manifestação de simpatia ou amizade especial
da parte do Presidente. Limitava-se a cumprimentar-me sem aquelas brincadeiras
que fazia com os demais colegas de profissão. Notava-se que o Presidente Kumba
Ialá não ia com a minha cara. Vim a saber através de um assessor dele que o
Presidente não ia à bola com pessoas formais. Eu era formal porque julgava e
ainda julgo que um jornalista não se pode pôr na galhofa com um chefe de Estado
em pleno Palácio da Presidência.
Não censuro os meus colegas, nem repudio o
comportamento do agora defunto Presidente. Era assim. Kumba Ialá era autêntico
diga-se o que se disser dele. Das muitas entrevistas que lhe fiz lembro-me particularmente de uma em que
disse ao bom som que se o Supremo Tribunal não autorizar a sua candidatura à
presidência da República nas eleições de 2005 pura e simplesmente ia renunciar
à renuncia que tinha sido obrigado a fazer aquando do golpe de Estado militar
para desta forma retomar as suas funções de Presidente!
Quando a Lusa meteu essa notícia na linha foi um pandemónio na Guiné-Bissau.
Alguns colegas até chegaram a censurar-me pelo facto de ter feito aquela
entrevista à Kumba Ialá. Mas, defendi-me dizendo que apenas fiz o meu papel de
jornalista.
Não vou analisar aqui o desempenho especifico do Dr. Kumba Ialá como estadista
ou político, apenas gostava de sublinhar a forma simples como encarava as suas
responsabilidades. Às vezes simples até demais!
Nesta hora do seu falecimento devemos todos render-lhe a justa homenagem e
cuidar com que as suas ideais nobres sejam continuadas para o bem da
Guiné-Bissau.
Dr. Koumba Yalá