PR Nicolas Maduro
Fonte: http://www.cafenapolitica.com/sobre-o-blog/
O presidente Nicolás Maduro aproveitou o encerramento da X Feira
Internacional do Livro, um dos acontecimentos político-culturais mais
palpitantes da América Latina, no qual o Brasil era o país homenageado, tendo
reunido 240 mil pessoas, para anunciar o fim das guarimbas,
como são chamados os atos vandálicos que sobressaltam o país há mais de 40
dias.
Maduro só pôde fazer este anúncio depois que, na última semana,
militarizou estados fronteiriços com a Colômbia, onde estão concentrados os
grupos paramilitares, e os bairros ricos da capital Caracas e de outras 18
cidades do interior controladas pela oposição extremista.
Desde 12 de fevereiro, quando os líderes da oposição radical Leopoldo
López e Maria Corina Machado (o primeiro foi preso no início da arremetida, e a
segunda, que é deputada, processada por indução ao vandalismo), muita gente não
podia sair para trabalhar ou estudar, enquanto muitas linhas de ônibus e do
metrô eram suspensas para evitar os ataques aos trens, ônbus e carros
particulares.
Três prefeitos da oposição, acusados de contribuir ou participar dos
atentados, antes atribuídos aos estudantes, que provocaram a morte de 34
pessoas, 684 feridos e 1.675 detenções, foram presos por ordem judicial,
enquanto outros tantos estão na mira da justiça. Depois disso, os atentados
quase desapareceram por encanto, mas Maudro advertiu que ainda existem alguns
franco-atiradores, que, só neste final de semana, assassinaram mais três
pessoas: “As guarimbas se acabaram, já se desmancharam todas. Permanecem
(alguns) franco-atiradores e assassinos. Mas vamos atrás deles. Em operações
especiais, vamos a capturá-los, um por um. Já a guarimba (em
si) foi derrotada pelo desejo absolutamente majoritário de paz do povo
venezuelano”.
Os serviços de ônibus e metrô já estão completamente restabelecidos e os
veículos particulares podem trafegar normalmente nas ruas, porque estas foram
desobstruídas das barricadas e da presença dos chamados guarimbeiros.
Na manhã desta
segunda-feira, 24 de março, o país parecia retomar a calma
enquanto o governo nacional se ocupava em remover os escombros de muitos pontos
devastados por uma violência política que parecia ter engolfado o país numa
guerra civil do tipo Síria ou Ucrânia.
Só parecia, porque a Venezuela sobreviveu à provação com um governo
aparentemente unido e coeso e mantendo completo domínio da situação. Já a
oposição, antes coesa e poderosa, se desnorteava e não conseguia reunir mais do
que dez mil pessoas nas ruas de Caracas. Mesmo com o respaldo irrestrito da
mídia nacional e internacional, inclusive a brasileira, esfacelando-se em
diversos grupos, muitos dos quais agora propensos a atender aos chamados de paz
por parte do governo.
Mais uma vez, o regime chavista desbaratava outra tentativa da extrema
direita de fazer a população revoltar-se e derrubar o governo, tendo, pelo
contrário fortalecido o presidente e o movimento bolivariano, inaugurado há
quinze anos pelo falecido presidente Hugo Chávez. Era o mesmo movimento
orquestrado a partir do exterior, que depôs Chávez por 48 horas, em 2002 e o
que paralisou o país num movimento patronal conhecido como paro
petróleo, que durou 63 dias e fez o PIB recuar 30%.
Na verdade, estes movimentos, conhecidos como golpes assimétricos,
suaves ou “constitucionais”, que não recorrem à força bruta dos militares mas
que se infiltram na sociedade civil, a partir principalmente de estudantes e
outros endinheirados, são velhos conhecidos de Cuba.
—-
Este país derrotou, em outubro de 1962 a chamada Operação Mangusto,
patrocinada pelo governo dos Estados Unidos. Ela envenenou rios,
desfolhou plantações e desencadeou atentados em quase todo o país, “em 33
operações, 13 delas concentradas na guerra econômica , seis na política, cinco
no serviço militar , cinco no político e ideológico e quatro na subversão e
inteligência”, como diz a professora Tatiana Coll,
da Universidade Pedagógica do México.
Segundo a professora, “o objetivo explícito” era conseguir uma
revolta interna em Cuba para derrubar Fidel Castro e estabelecer um novo
governo semelhante aos de Batista, Duvalier e Trujillo.
“Alcançar a revolta interna”, diz ela, “tem sido o seu sonho dourado
desde então. Para isso foram investidos bilhões de dólares, juntamente com
todos os tipos de interferência e barbárie , apesar de todas terem sido
derrotadas”.
Outro golpe assimétrico foi igualmente neutralizado na Bolívia, em 2008, graças à ação do
presidente Evo Morales que, em combinação com a Unasul, desfez os planos de
secessão que pretendiam repartir o território em vários países, à semelhança do
que havia ocorrido na Iugoslávia depois da desintegração do Bloco Soviético.
Não por acaso, o embaixador americano em La Paz naquele dado momento, era
Phillip Golberg, funcionário antes destacado para despedaçar a Iugoslávia.
Golberg foi expulso do país depois que o governo o flagrou em reuniões com
grupos conspiradores na província insurreta de Santa Cruz
O vice-presidente boliviano, Álvaro García Linera, que é sociólogo,
relembrava ontem num programa televisivo, que nos anos 50, 60 e 70 , os golpes
de estado eram desfechados pelos militares, recorrendo ao núcleo duro do
Estado, as Forças Armadas. Mas este é, segundo diz, “o momento final e
primário” para impor políticas e estabelecer regimes de governo com base na
violência pura, com as mortes, as torturas e o exílio.
- Isto ocorreu, quando os Estados e a sociedade civil eram muito frágeis
– continua. Mas estes tempos se acabaram. Nos últimos dez anos, surgiu uma nova
modalidade de golpe, igualmente vinculado aos poderes externos, ou seja, às
políticas de dominação imperial. Aí já não se utiliza o recurso às forças
armadas. Mas sim sabe-se que se infiltra dentro da sociedade, apropriando-se de
um pedaço da sociedade civil, a partir do qual busca o enfrentamento de
sociedade civil contra sociedade civil para desestabilizar os regimes
democráticos.
Roteiro holywoodiano – Álvaro García ainda explica que, como forma de
mobilização, esses movimentos recorrem inicialmente a grupos sociais
minoritários, mas muito ativos e com capacidade de provocar ações violentas, em
nível local. A partir daí, vão tentar ocupar territorialmente pedaços: ocupar
uma região, ocupar um município e, se conseguem produzir um efeito social e
maior aglutinamento de forças, avançam até o a disputa do controle político de
um específico território do país.
Chegando aí, passa a buscar um tipo de ajuda externa e, em torno desta estratégia,
“de corte comum e de roteiro quase holywoodiano”, com o respaldo de alguns
meios de comunicação, que alimentam e magnificam midiaticamente o que sucede
localmente, sugerindo sociedades enfrentando governos democráticos, mas que
agora chamam de totalitários.
Entra também o apoio de certas ONGs vinculadas ao Norte (Estados Unidos
e Europa). E por último, a partir desta mobilização, a convocação e a presença
de intervencionistas estrangeiros, para converter este problema local num
problema nacional, que têm de ser resolvido, já não pelos concidadãos, mas por
forças externas e, se todo esse esquema avança, a possibilidade uma intervenção
militar.
Ao relembrar a experiência boliviana de golpe suave, em 2008, o
vice-presidente Álvaro García, disse que, na época, houve sabotagens econômicas
de um certo núcleo muito conservador do setor empresarial, procurou-se gerar
escassez de alimentos e imediatamente depois se deu um processo de
desestabilização política, com influência na Assembleia Constituinte de então,
a realização de plebiscitos ilegais e, finalmente, a ocupação territorial.
Para isso, mobilizaram setores sociais, na ocupação de 70 instituições,
no espaço de uma semana. Proibiram o presidente da República aterrissar em
aeroportos de seis dos estados, porque haviam sido ocupados geográfica e
territorialmente as instituições, mediante as mobilizações de vândalos que destruíam,
queimavam e atacavam militares e a polícia. Finalmente, assumiram atitudes violentas,
levando adiante massacres de camponeses e indígenas. Tudo tendia a terminar na
convocação da intervenção estrangeira
O quadro foi um pouco menos grave na Venezuela de Maduro. O presidente,
afinal, depois de 40 dias de intensos tumultos, anunciar o fim das guarimbas,
acontecimento que coincide com a chegada a Caracas, nesta segunda, 24, da
Comissão dos 12 chanceleres da Unasul (União das Nações Sul-americans) para
analisar a situação no país. Ela deverá se entrevistar com representações
estudantis, membros do governo e da oposição.
Ao mesmo tempo, o chanceler Elías Jaua se deslocará pelas sedes dos principais organismos
internacionais, como a própria Unasul, (Quito, Buenos Aires Brasília), OEA
(Washington), a ONU (Nova York e Genebra) e seus respectivos órgãos de direitos
humanos, para apresentar as provas documentais dos danos provocados pelos atos
violentos, incluindo o incêndio que produziu perda total em uma universidade de
3.800 alunos, em são Cristóbal, e parcial em outras 15 escolas superiores e
bibliotecas pelo restante do país.
Com efeito, no dia 20 de março, o núcleo da Unefa (Universidade das
Forças Armadas, uma espécie de ITA brasileiro da Aeronáutica, que Hugo Chávez
estendeu para todo o país), na Universidade de São Cristobal, capital de
Táchira, estado na fronteira com a Colômbia, foi cenário de uma série de
ataques. Grupos de ultradireita arremessaram bombas molotov e pedras até entrar
no campo universitário, onde incendiaram o prédio, destruindo mobiliário,
classes, laboratórios, arquivos, computadores e biblioteca, com perda total.
Também nesse mesmo dia, na sede da Unefa, em Los Teques, capital do
estado de Miranda, centro norte, indivíduos entraram violentamente na
instituição, amordaçaram os seguranças e jogaram gasolina, provocando outro
incêndio que ocasionou danos ao mobiliário, arquivos e equipamentos de
computação.
Além das escolas, houve atentados contra hospitais, postos de saúde e
creches públicas, estações do metrô, companhias estatais de telefone e
eletricidade e 198 ataques cibernéticos a sites de TVs e órgãos governamentais,
trancamento das vias principais e danificação de semáforos e 94 ônibus urbanos,
totalizando prejuízos de alguns bilhões de dólares e graves danos à economia.
Por que incendiar livros – No pronunciamento de ontem à noite na FILVEN, o presidente
Nicolás Maduro indagou o porquê desta violência: “Quem pode queimar uma
universidade, que é o lugar onde chegam os conhecimentos mais elevados que a
humanidade criou para a formação de suas gerações futuras?”
Por isso, solicitou o apoio dos intelectuais escritores, pensadores e
comunicadores para que acompanhem o chanceler Jaua na peregrinação pelos
organismos internacionais, “para que o mundo inteiro abra os olhos e se
fortaleça a solidariedade com nossa pátria”, segundo frisou o presidente, para
quem “a Venezuela foi vítima de uma arremetida de ódio e intolerância”.
Maduro prova assim que não só controla o seu país, ao contrário do estereótipo
de que não tem carisma nem capacidade para administrar, só porque foi motorista
de ônibus, como está aparelhado para enfrentar arremetidas mais violentas, como
aquelas de Cuba e da Bolívia, que certamente serão reativadas em futuro não
muito distante.