quinta-feira, 29 de maio de 2014

A reinvenção do modelo económico ao serviço da Nação

Luís Vicente

Por: Luís Vicente (Cuca)

O nosso desempenho económico só melhora com melhores instituições, melhor justiça, melhor Estado, melhor administração e a sua relação com os cidadãos e empresas. A existência de um futuro para a economia guineense, bem como a renovação da esperança dos guineenses, implica uma alteração total do nosso modelo de desenvolvimento. As reformas estruturais devem ser encetadas e concretizadas com sucesso. Mas, para isso, é importante criar condições de participação pública e privada na esfera da economia real, dando ênfase às iniciativas geradoras de emprego e aumento da produtividade.

Nesta primeira fase é importante que a política económica seja orientada para restaurar a credibilidade financeira do País, para reduzir o endividamento nacional e o défice externo, para fomentar a produtividade e competitividade e, para promover uma sustentada reforma e a criação de emprego e solidariedade social. Para que resulte no plano geral, torna relevante definir uma política coerente de atração do investimento privado através de criação de um ambiente favorável para o negócio, com a necessária incrementação de uma diplomacia económica credível, garantindo que os investimentos sejam executados pelos promotores mas salvaguardando os interesses nacionais. Sem juízos de valor, julgo que é importante:
1)    Imprimir uma nova dinâmica junto dos doadores e parceiros internacionais no sentido de garantir liquidez necessária para o funcionamento da economia e finanças do País.

2)    Fomentar o investimento privado e ponderar a possibilidade de avançar com as parcerias público privadas de forma séria e responsável no âmbito de um caderno de encargos que salvaguarde os interesses nacionais.

Renegociar os acordos bilaterais assinados com as empresas e Estados parceiros para exploração de bens não renováveis tais como o petróleo (segundo informações, a petrolífera “Oryx Petroleum” estará a efetuar trabalhos de exploração de crude numa zona de controlo conjunto do Senegal e da Guiné-Bissau. O acordo existente determina que a receita da exploração será repartida em 80% para o Senegal e o restante para a Guiné-Bissau). Como é óbvio, é inconcebível manter a lógica de 80% e 20%, tais como os acordos para exploração de bauxite e fosfato assinados com empresas angolanas, também nas mesmas condições, que urgentemente devem ser reavaliadas. O mesmo se aplica as areias pesadas da Varela, uma situação que urge resolver.

3)    Reativar os acordos bilaterais assinados no quadro das pescas, mas ter em atenção os investimentos que podem ser desenvolvidos nesta área, tais como: investimento e desenvolvimento de frotas nacionais; desenvolvimento de infraestruturas de apoio e indústria de transformação; investimento na segurança e higiene por forma a dotar o país de maior capacidade de realização de controlo sanitário do pescado internacionalmente aceite; investimento no reforço das capacidades nacionais de controlo e de vigilância da nossa Zona Económica Exclusiva.

4)    Avançar com a recuperação dos Portos de Pindjiquiti e de Buba. Com a recuperação do porto de “Pindjiguiti” o país poderia receber navios de grande porte e assim escoar as mercadorias por toda a África sem passar pelos portos da Gâmbia e do Senegal. Dispondo de todo o potencial marítimo a funcionar em pleno o país deveria usar a sua posição geoestratégica tendo em conta os vizinhos do Mali, Guiné-Conacri, Gâmbia e Senegal.

Esta localização geográfica é uma mais-valia que proporcionará uma vasta Zona Económica Exclusiva configurada num espaço marítimo interterritorial que bem projetado aproveitaria a importante fonte de recursos naturais. Com a construção do porto de Buba, as transações económicas entre a Guiné-Bissau, Mali e Guiné Conacri serão mais eficientes e lucrativas. A distância entre estes países sendo próximos, comparativamente com o Senegal, resultará numa maior eficiência económica uma vez que o porto de Dakar é mais distante o que faz com que transação entre bens e serviços seja mais cara. É importante que seja feito através do Investimento direto estrangeiro e nacional.

5)    Incentivar o investimento direto estrangeiro e nacional na área de transformação e processamento da castanha de caju. Esta é uma área que deve ser pensada estrategicamente. Deve ser possível criar o conceito “Valor Acrescentado” de modo a que a sua dimensão e cotação seja justa.
A exportação da castanha processada poderá representar um ganho de 95,8% relativamente à exportação da castanha em bruto. A indústria de processamento da castanha de caju é intensiva em mão-de-obra e pode desempenhar um papel importante no combate ao enorme desemprego que se regista no País. Tem um impacto grande na economia nacional, uma vez que é indutor de “ + atividade industrial + serviços + empregos + rendimentos + contributo para o PIB.

6)    Apostar fortemente na agricultura e retomar o Plano Nacional de Investimento Agrário - Política Agrícola Comum da CEDEAO, na sua primeira fase e parte da segunda fase através da criação ou reabilitação de estruturas e infraestruturas de apoio à produção e reforçar a consolidação de iniciativas e dos investimentos privados, ao desenvolvimento e consolidação de cooperativas, de organizações camponesas e instituições de micro-finanças.

Para além disso, é importante ter em atenção a questão da agroalimentar, este é um sector onde podemos ter uma vantagem competitiva sustentável em relação aos nossos vizinhos.

7)    No setor de turismo, realça-se a importância das excelentes condições e potencialidades turísticas aliadas à riqueza e diversidade cultural resultante do seu museu étnico, a gastronomia associada à excecional e rica paisagem natural, conferem à Guiné-Bissau vantagens competitivas sustentáveis para oferta de produtos turísticos altamente valorizados e em todos os seus domínios, nomeadamente, Turismo de Sol e Praia, Ecoturismo, Turismo Rural, Turismo ligado à Pesca e Caça Desportivas, etc.

A Guiné-Bissau tem uma localização geográfica invejável para o desenvolvimento do turismo de forma intensiva. A Zona Costeira, constituída pelo Arquipélago dos Bijagós e a orla marítima continental, apresenta grande variedade de animais marítimos, excelentes praias e vários parques nacionais, destacando-se o Parque Nacional Marítimo do Complexo de João Vieira – “O Poilão” - Santuário das tartarugas marítimas - e o Parque do Grupo das Ilhas de Orango. Na Zona do Interior, que engloba o Leste, o Norte e parte Sul do país, existem diversos parques naturais e extensas savanas que para além de permitirem a prática de caça, oferecem lugares pitorescos pelas suas gentes, fauna e flora, próprios para o desenvolvimento do Turismo Rural.

É importante e necessário desenvolver uma política pública para este setor no sentido de dar a conhecer as suas reais potencialidades e oportunidades de negócios por forma a criar um referencial positivo para o País. Tem sido feito muito e bom trabalho de divulgação, mas importa agora definir uma estratégia mais consistente para o seu desenvolvimento.

8)     No que concerne à economia do mar, realço a excelência do trabalho que está a ser desenvolvido pela equipa da Comissão Nacional de Extensão da Plataforma Continental da Guiné-Bissau – Extensão para além das 200 milhas marinhas - reforçando precisamente que a grande parte dos recursos económicos do País poderão advir da economia do mar.

Na verdade, para além dos recursos pesqueiros o mar tem um papel importante na nossa economia, não só como fonte de recursos alimentares, mas também uma fonte de recursos minerais, geológicos e de matérias-primas que podem ter um impacto substancial na economia da Guiné-Bissau. O conhecimento do mar profundo poderá trazer enormes potencialidades dos novos espaços marítimos ao país.

A Guiné-Bissau possui uma faixa marítima de 274 km de costa para uma superfície de plataforma continental de aproximadamente 53.000 Km2, o que representa 75% do total da Zona Económica Exclusiva (ZEE). Em média, a plataforma continental desce até uma profundidade de 200 metros, atingindo as bacias oceânicas. A característica principal da Plataforma Continental da Guiné-Bissau reside na existência de uma vasta placa continental, suportando um número considerável de ilhas e ilhotas (aproximadamente 80).

A Extensão da Plataforma Continental poderá proporcionar ao País uma oportunidade para sair da letargia económica em que se encontra, pois a descoberta recente de formas de vida a grandes profundidades, com potencial de exploração biotecnológica poderá ser uma possibilidade para o país, no futuro, obter potenciais benefícios ao nível da economia e consequentemente atrair investimentos das indústrias farmacêuticas.

A concretizar este projeto terá um impacto socioeconómico que produzirá mais riqueza e melhor qualidade de vida, permitirá o País afirmar-se como uma Nação marítima no contexto da CEDEAO, estabelecendo consequentemente um melhor futuro para as gerações vindouras que certamente irão usufruir e explorar esta vasta zona marinha.

Para obtermos crescimento e competitividade na Economia do Mar temos que valorizar este potencial como fonte de riqueza económica, de conhecimento e de exploração sustentável dos seus recursos. Assim, é importante promover a coordenação intersectorial e interinstitucional e a cooperação entre “stakeholders” públicos e privados com intervenção na área do Mar segundo lógicas que valorizam a participação ativa através de uma abordagem “top-down” e “bottom-up“; Modernizar as atividades marítimas tradicionais e desenvolver novas atividades, produtos e serviços inovadores direcionados para a exportação; Reforçar a investigação, o desenvolvimento tecnológico, a inovação e a formação na área do Mar.

O conhecimento do mar profundo poderá trazer enormes potencialidades dos novos espaços marítimos ao país, nomeadamente: 1) Recursos Minerais - Metálicos: Recursos fundamentais para aplicações industriais de grande valor, nomeadamente no fabrico de ligas metálicas com utilização em indústrias de ponta como a aeroespacial, eletrónica e nanotecnologia. Não metálicos: Siltes, areias e cascalhos aplicados à construção civil e obras públicas. Energéticos Não-Renováveis: Novas oportunidades de prospeção de hidrocarbonetos e hidratos de metano; 2) Recursos Biológicos - Biotecnologia: É a nova vaga da economia assente no conhecimento, criando oportunidades para indústria alimentar e farmacêutica, desenvolvimento de medicamentos modeladores hormonais, antibióticos, antivirais, antifúngicos, etc.

9)    Finalmente, impulsionar as atividades previstas pela Agência de Promoção do Investimento – APIGB - tais como: Promoção da Guiné-Bissau como destino de investimento; Investigação e identificação dos investidores nacionais e estrangeiros; Seguimento dos contatos e avaliação dos projetos de investimento; Disponibilização permanente de informações económicas, comerciais e tecnológicas; Acolhimento e acompanhamento dos investidores nas etapas do investimento; Assistência aos investidores para as formalidades de formação de empresas e obtenção das diversas autorizações administrativas; A resolução dos problemas administrativos. Saliento ainda que nesta área, existe todo um trabalho teórico muito bem desenvolvido pelo nosso compatriota Pedro Té, a quem dou os meus parabéns pela clareza na abordagem.
Concluo ressalvando o seguinte: Porém, “é um risco enorme pensar que a riqueza económica reduz a pobreza, ou que a industrialização constrói a riqueza cultural. Talvez seja importante consciencializarmos que a grandeza de uma Nação reside na essência do seu povo, a tal que se busca através da educação e do conhecimento.”

Lisboa, 28-05-2014