Paulo Portas (grande artista)
Por: Anônimo
Como todos
os bons artistas, não tem problemas em desempenhar vários papéis. Já foi rebelde,
já foi estadista, já foi amigo dos lavradores, do
"espoliados do Ultramar", dos ex-combatentes, dosreformados,
das empresas, dos feirantes, dos trabalhadores.
Já foi liberal e democrata-cristão.
Já foi radical e
desancou nos imigrantes e no RSI.
Já foi moderado e
cheio de preocupações sociais. Servem-lhe todos os bonés que a cada momento lhe
convenham.
O seu
talento é inversamente proporcional à firmeza das suas convicções.
Paulo Portas
tem muitas vidas. E como
nunca morre, vai cada vez mais longe no risco. Disse que deixaria de falar a um
amigo se este fosse para o poder. Nenhum amigo sobreviveu à sua sede de poder.
Já teve, quando foi candidato à Câmara Municipal de Lisboa, um cartaz em que
jurava: "Eu fico!" Foi eleito vereador, não ficou e ninguém lhe pediu
contas. Foi-se embora da liderança do CDS porque um "partido
trotsquista" estava demasiado próximo. Fez a vida negra a quem o
substituiu e, à primeira oportunidade, voltou, como se nada fosse. Deixou cair
todos os que lhe pudessem fazer sombra. Fez a sua corte, sem nunca deixar que
alguém pudesse ser visto como candidato ao seu lugar. Prometeu mundos e fundos
a todos os seus eleitores.
Nunca
cumpriu uma promessa.
Agora Paulo
Portas faz o papel da consciência social deste governo. Podia ser outro
qualquer, mas este é o que agora lhe convém. Como sempre, comentadores e
jornalistas fingem que não sabem quem é Portas. Ele dá bons espetáculos e os medianão
querem estragar bons momentos televisivos, bons diretos, bons dramas
cuidadosamente encenados.
Soubemos, no
entanto, pelos jornais, que a sua brilhante homilia de domingo foi
combinada com Passos Coelho. E ontem ela chegou ao fim: a
Contribuição Extraordinária de Sustentabilidade, que representa uma pequeníssima
parte do pacote de austeridade, caiu. Gaspar já tinha deixado uma margem
razoável para ela cair. Porque ela apenas foi criada para isso mesmo:para
que Portas aceitasse tudo menos uma coisa que já se sabia que não era para
avançar.
Para Portas
fingir que fazia voz grossa e Gaspar e Passos fingirem que o respeitavam. E
assim, aceitando tudo, Portas consegue passar a ideia de que a sua presença
neste governo muda alguma coisa. E o governo repete a rábula do costume: avança
com o impensável para depois recuar para o inaceitável.
Durante o
fim de semana, o exército de comentadores-ex-líderes do PSD, alinhados com os
ministros que usam Portas e as fugas para a imprensa para não ficarem mal na
fotografia, ajudaram nesta encenação: que Portas está mais forte, que Gaspar já
cede às suas exigências, que tudo está diferente.
Está tudo na
mesma. Até os malabarismos do CDS não mudam. Só há um problema: o espetáculo pode ser bom, mas
não sei se vale o suficiente para estar em cartaz tanto tempo, sem um momento de
improvisação, sem uma surpresa, sem qualquer espaço para a espontaneidade.
Sempre o
mesmo enredo, sempre a mesma cantiga.