quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Manifesto-me contra!!!

Foto: Funeral do PR Malam Bacai Sanha

"Eles ouviram da minha boca as verdades que estavam dentro de si. Nunca escutamos senão a nossa própria voz". Amin Maalouf in "Os Jardins de Luz"

Pude no ano passado participar em duas megas manifestações, ou `Manifs`(como gosto de chamar) uma em Lisboa e outra em Brasília, na primeira estiveram mais de 40 mil pessoas nas ruas da Baixa Pombalina, e a segunda com cerca de 25 mil pessoas, numa marcha feita na Esplanada dos Ministério, todas elas retratadas com fotos e artigos neste Blog. 

Como queria escrever algo sobre a grande Manif que foi o funeral do falecido presidente da Guiné-Bissau, Malam Bacai Sanha, e não consegui `checar` em nenhuma das notícias e informações, o número aproximado de pessoas que acompanharam toda a cerimônia fúnebre do Grande Combatente da Liberdade que foi Malam Bacai Sanha, fico pela consideração dos largos milhares de pessoas pois disso não tenho dúvidas.

Foi um fim-de-semana (14-15 de janeiro) com mar de gente caminhando, chorando, orando não só pela grande perda, dessa figura impar, que marcou de forma positiva e sábia o exercício da política na Guiné-Bissau, mas também para se despedir de um homem público, Chefe de Estado, lutador incansável pela construção da Nação guineense. Um homem de Paz, que trabalhou, honrou e dignificou cada VOTO de confiança depositado por cada guineense que o elegeu, Presidente.

A meu ver no dia de sábado(14) partilhou-se entre os que estavam na terra à chegada das exéquias do malogrado Presidente, uma das maiores manifestações de pesar e condolência em Bissau. Para os que estão fora (que é o meu caso) os olhos ficaram colados ao monitor do PC, para ler e ver imagens que tocam (não estou a falar daquelas imagens desfocadas tiradas da TV guineense) qualquer um. No meu imaginário guardo a imagem duma moldura humana (poucas vezes vista, naquela dimensão no país) que tomou conta das estradas avenidas, ruas e passeios de terra batida, marchando atrás dos restos mortais do homem que marcou o seu tempo. 

O guineense acompanhou para a última morada com respeito, honra e dignidade um filho da terra, que Lutou, Sacrificou e deu a sua vida pela identidade guineense. E esses valores nós como os outros, temo-los! E demos a mostra disso ao Mundo. Foi uma Manif humana e sentida que tocou o Mundo. Afinal somos gente!!! 

No domingo(15 de janeiro) dia que marcou o funeral, mesmo estando longe, pelas imagens, chega-se a conclusão que o número da população que saiu a rua entra no panteão da nossa memória coletiva, foi sem dúvida uma das maiores manifestações populares da era democrática. 

Aplaudo já agora, a  decisão  reconciliador do governo em projectar a construção do Panteão Nacional. O espírito Reconciliador do PR Malam Bacai Sanha imperou até na morte. Recorro a uma frase que escutei uma vez de um outro Antigo Combatente Tchambu Mané, cito: “Riconciliaçon na ten ora ku nô sibi purda n’utru disna dê mundo, tê na utru mundu...”.

Considero apenas, que não se deve reduzir o Panteão Nacional aos ex-Presidentes da República e aos heróis da luta de Libertação Nacional, como Luís Cabral e Nino Vieira. Mas também os que souberam dignificar a guineendade sendo expoentes noutras áreas de intervenção. 

Dou um exemplo: José Carlos Schwarz.


E sobre Amin Maalouf? Pois...Lá estou eu a falar de pessoas...   

É o detentor da frase que abre este artigo. Li-a no livro “Os Jardins de Luz” em 2004, um belo livro do escritor Amin Maalouf, que chegou-me às mãos numa edição chancelada pelo jornal português “Público-Comunicação Social”.  No ano em que o li, tinha muito tempo para ler, pois aproveitava as tardes lentas da época das chuvas, com aquele fresco pincelado pelo cheiro do chão molhado de Mansoa. Que saudades de Mansoa! No quintal da casa onde morava, tinha uma mangueira, obviamente, isso é quase regra em todas as casas da Guiné, mas também tinha uma rede (essa plantada por moi) de náilon com cores fortes. A rede de que falo, é à famosa “rede do preguiçoso”  palavreando os nossos irmãos brasileiros. 

Era aí que passava as longas e lentas tardes, e estendia o corpo naquele balouçar tranqüilo e sossegado contemplando o presente. Sonegado (não no sentido do Direito Civil) pela leitura, não deixava ser interrompido por ninguém, a não ser por aquela soneca traiçoeira duma boa sesta.     

Amin Maalouf é um escritor fabuloso, foi jornalista, e neste momento faz parte da universalmente respeitada e reconhecida Academia Francesa. Originário do Líbano, mas sem complexos de inferioridade ou de superioridade, é um dos pensadores mais proeminentes da língua francesa. Tive uma paixão à primeira leitura, pelo pensamento conciso e lúcido deste escritor quando li no livro  “Identidades Assassinas” que é um ensaio que nos faz mergulhar no conceito da “Identidade” com paixão. 

Ele pega na intolerância, no medo, na violência, na ignorância, com que se cozem certas “Identidades” e rasga-@s ao meio, numa magnífica aula de quase tudo um pouco desde Estória, Etnografia, Filosofia até Teologia e demais (ias) das Ciências Sociais e Humanas, Ocidentais e Orientais, que pincelam e dominam o Mundo das religiões e escalam os títulos Universais, aceite ou negado por cada um de nós conforme orientação religiosa, política, social, étnico e etc ...;-)

Numa escrita delirante, explora bem aquela resposta, para tantas perguntas como: O que é a Raça? Qual foi a finalidade do outro que estipulou as Crenças? Afinal qual é a nossa identidade? Ou seja, num amarfanhado de ensinamentos e conhecimentos, terminamos o livro com a impressão clara de que qualquer tipo de propagandista fanático é uma pessoa “passado da tola”.  Para terminar confesso que, o livro deste escritor que fez disparar aquela saudade de Mansoa, de Bissau da Guiné e instigou-me para este texto foi definitivamente “Os Jardins de Luz” título original “Les Jardins de Lumiére”. Porquê? Dirá o leitor?

Porque manifesto-me contra mais uma encomendada condenação a morte civil, judicial e política da Constituição da República da Guiné-Bissau. Manifesto-me contra o erro de comporta-se como donatário da Guiné, ou julgar-se semideus pensando que está acima de qualquer lei. 

Mani-festo-me


"A partir daí, Mani começa a divulgar aos desprotegidos a sua verdade. As suas idéias constituiriam aquilo a que hoje chamamos “maniqueísmo”: a doutrina da luz que triunfa sobre as trevas; do bem que em cada homem subjugará o mal. Luz e trevas, bem e mal residem no interior de cada homem. Cabe a cada um conduzir essa luta rumo ao triunfo da Luz. Mani prega, com escândalo, o fim das castas e a união de todas as religiões, de todos os homens. Mas essa viria a ser a razão da sua condenação: porque os homens não querem que lhes digam que a sua religião é verdadeira; preferem que lhes mostrem que as outras crenças estão erradas. 


Mani, o profeta médico que assim faz milagres humanos; o profeta pintor que pregou a beleza não defende um Deus todo-poderoso, mas um Deus bom, que recusa a guerra e o poder. Mani, o homem que tentou conciliar os homens e por isso foi condenado. Por defender uma religião baseada na alegria, na cor, na musica, na arte, no saber, nos perfumes…na luz! Quando os Sassânidas e os Romanos se decidem pela paz e não pela guerra, a corte do rei Sapor ficou indignada. Porque a guerra implica triunfo, glória e, principalmente tributos e saques. Sem guerra não há riqueza nem poder. Mani defendia a paz. Era preciso detê-lo." - "Os Jardins da Luz" - Amin Maalouf